Edgar Allan Poe

Poesia norte-americanaEdgar Allan Poe (1809-1849) foi um dos autores favoritos de minha juventude, mesmo sem que eu tivesse a maturidade intelectual suficiente para entender seu trabalho na época e, sinceramente, ainda hoje duvido que tenha tal maturidade.

De qualquer forma, com o passar do tempo, em cada releitura de Poe, seja prosa ou poesia, sempre encontrei novos significados e o prazer adolescente renovado.

Os 40 anos de vida de Poe foram trágicos e atormentados pelo álcool. Ele tinha imenso prazer em identificar-se com a sua própria criação, por isso trajava sempre roupas negras, principalmente nos salões onde declamava seus poemas. Os contos fantásticos e sobrenaturais de Poe são muito famosos (O Poço e o Pêndulo, O Gato Preto, A Queda do Solar de Usher etc). Na verdade, poucos autores dominaram tão bem o estilo do conto quanto ele, além de ter sido um precursor do estilo policial (Os crimes da rua Morgue).

Na poesia, a sua composição mais importante foi, sem dúvida, O Corvo. Transcrevo abaixo apenas a primeira estrofe em três traduções de diferentes épocas e estilos:

The Raven
(Edgar Allan Poe)

Once upon a midnight dreary, while I pondered, weak and weary,
Over many a quaint and curious volume of forgotten lore -
While I nodded, nearly napping, suddenly there came a tapping,
As of some one gently rapping, rapping at my chamber door.
"'Tis some visitor", I muttered, "Tapping at my chamber door -
Only this and nothing more."


O Corvo
(Tradução de Gondin da Fonseca)

Foi uma vez: eu refletia, à meia noite erma e sombria,
a ler doutrinas de outro tempo em curiosíssimos manuais,
e, exausto quase adormecido, ouvi de súbito um ruído,
tal qual se houvesse alguém batido à minha porta, devagar.
"É alguém - fiquei a murmurar - que bate à porta, devagar;
sim, é só isso e nada mais."


O corvo
(Tradução de Machado de Assis)

Em certo dia, à hora, à hora
Da meia-noite que apavora,
Eu caindo de sono e exausto de fadiga,
Ao pé de muita lauda antiga,
De uma velha doutrina, agora morta,
Ia pensando, quando ouvi à porta
Do meu quarto um soar devagarinho
E disse estas palavras tais:
"É alguém que me bate à porta de mansinho;
Há de ser isso e nada mais."


O Corvo
(Tradução de Fernando Pessoa)

Numa meia-noite agreste, quando eu lia, lento e triste,
Vagos curiosos tomos de ciências ancestrais,
E já quase adormecia, ouvi o que parecia
O som de alguém que batia levemente a meus umbrais.
"Uma visita", eu me disse, "está batendo a meus umbrais.
É só isto, e nada mais."

"Os mistérios da mente e da morte constituem o tema principal dos contos de Poe. Os terrores que ele descreve com intensidade e impressionante realismo são terrores que se geram na própria mente do personagem, e a realidade ambiente é vista através desse terror e por ele deformada" (Oscar Mendes - Edgar Allan Poe, Ficção Completa, Poesia e Ensaios - Editora Nova Aguilar).

Comentários

Barros (RBA) disse…
Como você já sabe, esse é um de meus prediletos.
Bem interessante também, é sua biografia.
Alexandre Kovacs disse…
No caso de Edgar Allan Poe, a vida é totalmente compatível com a obra.

Segundo o excelente ensaio de Ricardo Araújo "Um homem em sua sombra" da Ateliê Editorial: "Poe talvez nunca tenha tido uma família. Parece que um impulso interior o manteve quase sempre só (...)".

Ainda segundo o mesmo ensaio: "Os últimos meses de vida de Poe foram vividos de forma alucinante. Em bares noturnos, em reuniões com bêbados e vagabundos, de cidade em cidade (...) É assim que, no dia 23 de setembro, Poe sai de Richmond, viaja de navio até Baltimore, onde aporta a 29 de setembro. O que realmente aconteceu com Poe, em Baltimore, nesses poucos dias, nunca foi totalmente comprovado. Todas as informações sobre os últimos dias de setembro de 1849 e a primeira semana de outubro desse mesmo ano estão plasmadas por uma aura de mistério, por fatos que não foram ainda completamente elucidados. (...) Foi na rua, em estado semidemente, semimendigo, que um velho amigo de Poe o encontrou, o Dr. James Snodgrass. Segundo a versão de Snodgrass, Poe estava mais morto do que vivo em frente a uma taverna e, nessas condições, levou-o ao hospital Washington. Nesse hospital, em 7 de outubro de 1849, Edgar Allan Poe morreu, isto é, o coração negro deixou de bater."
Barros (RBA) disse…
Relendo seus comentários onde faz uma evocação de seus tempos de juventude, veio-me estas reminiscências.

Minha primeira leitura de Poe foi por “indicação” de meu pai, quando ainda entrava nos primeiros anos de minha juventude, após ouvi-lo falar sobre o poema “O Corvo” e das famosas histórias de mistério. Este fato me faz lembrar, alguns anos antes, meu pai recitando “Versos Íntimos” de Augusto dos Anjos, quando eu ainda estava na tenra idade do início da adolescência.

Anos mais tarde, conheci Baudelaire e seu livro de poemas “As Flores do Mal” graças à leitura de uma biografia resumida de Poe (Baudelaire que alem de ter sido influenciado por Poe, foi seu grande incentivador e tradutor de sua obra para o Francês). E daí em diante, outras conexões similares foram sendo feitas e um leque de opções de qualidade literária extraordinária foi se abrindo, ao mesmo tempo em que também sofre transformações.
Por isso tudo, este autor tem uma importância muito grande para mim.
Anônimo disse…
Poe foi um dos meus autores prediletos.
Tenho muito de Fernando Pessoa, talvez mais do que gostaria de ter (essa personalidade múltipla...). Excelente seu texto. Gosto de Poe. Gosto de pessoas coerentes...

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