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Mostrando postagens de fevereiro, 2011

Moacyr Scliar (1937-2011)

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  "Noel Nutels. Lembro como se fosse hoje  o primeiro dia em que o vi, menino ainda. Foi no navio que nos trouxe para o Brasil, em 1921. Era um navio alemão, mas não tinha nome alemão, chamava-se 'Madeira', em homenagem à ilha portuguesa. Simbólica coincidência: de certa forma refazíamos a viagem dos navegadores portugueses, Cabral e os outros. Como eles, atravessaríamos o oceano, rumo ao Brasil; não numa precária caravela, mas também não num luxuoso transatlântico - longe disso. O senhor precisava ter visto o 'Madeira', doutor. A rigor, nem navio de passageiros era; tratava-se de um cargueiro adaptado para o transporte de emigrantes. No porão tinham instalado beliches, oitenta beliches triplos, quase nenhum espaço entre um e outro. Latrinas, quatro; pias, quatro, nem sempre com água. Era impossível ficar naquele porão, passávamos a noite lá, mas mal amanhecia subíamos para respirar um pouco de ar fresco. O senhor conhece aquele quadro do Lasar Segall, 'Na

20 frases de Millôr Fernandes

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Difícil escolher apenas 20 frases de Millôr Fernandes, desenhista, humorista, tradutor e escritor carioca, um dos fundadores em 1969 do jornal "O Pasquim", símbolo da resistência contra a censura na ditadura militar. Simplesmente um homem inteligente como poucos em nosso país. Que falta imensa nos faz o Millôr para comentar esse noticiário atual. (01) Também não sou um homem livre. Mas muito poucos estiveram tão perto; (02) De todas as taras sexuais, não existe nenhuma mais estranha do que a abstinência; (03) Uma mulher nunca é tão bela quanto já foi; (04) Estou escrevendo minha biografia. Mas ainda não decidi o final; (05) Quando fizerem minha autópsia encontrarão o Rio no meu coração; (06) O capitalismo é a exploração do homem pelo homem. E o comunismo é exatamente o contrário; (07) Ser brasileiro me deixa sempre um pouco subdesenvolvido; (08) Brasil, país do futuro. Sempre; (09) Viver é desenhar sem borracha; (10) Minha especialidade e meu org

Tamara de Lempicka

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Após a revolução russa de 1917, a polonesa Tamara de Lempicka (1898-1980) mudou-se com o marido para Paris onde participou ativamente da cena cultural nos anos 20 e 30 juntamente com artistas como Picasso. O seu estilo é uma espécie de Art Deco com Cubismo empregando temas que misturam ingenuidade e sensualidade. A bela Tamara conquistou muitos artistas de sua época, homens e mulheres. Seu comportamento acabou provocando a separação do marido em 1928. Também afastou-se da filha Kizette, apesar da mesma estar sempre presente em seus quadros (a metade superior da imagem abaixo é do quadro A garota adormecida Kizette de 1933).

Wallace Stevens

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Wallace Stevens - Poemas - Editora Companhia das Letras - 208 páginas - Tradução e Introdução de Paulo Henriques Britto - Lançamento 1987. A biografia de Wallace Stevens (1879-1955) não é exatamente um exemplo do que convencionamos imaginar da vida de um poeta. Após formar-se em direito, trabalhou como advogado por alguns anos e, em 1916, entrou para uma empresa de seguros chamada Hartford Accident and Indemnity Company onde trabalhou por toda a sua vida, chegando ao cargo de vice-presidente. Ao contrário de outros poetas americanos como T. S. Eliot e Ezra Pound, Wallace Stevens jamais esteve na Europa (apesar de influenciado pelos simbolistas franceses) e sempre preservou a sua vida particular evitando os holofotes da fama. Pouco antes de morrer, talvez um pouco contrariado, ganhou o Pulitzer de Poesia em 1955. Todo o seu trabalho foi influenciado pela oposição entre imaginação e realidade. Segundo Paulo Henriques Britto, para Stevens "a imaginação é a função bási

William Carlos Williams

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William Carlos Williams - Poemas - Editora Companhia das Letras - 272 páginas - Tradução e Introdução de José Paulo Paes - Lançamento 1987. Diferente de seus contemporâneos Ezra Pound e T. S. Eliot que buscaram inspiração na poesia europeia e também nos clássicos gregos e latinos, chineses e japoneses, William Carlos Williams (1883-1963) encontrou o ritmo de sua poesia na própria índole do povo americano, tendo nascido e morrido em Rutherford, uma pequena cidade de Nova Jersey próxima de Nova York. Ele achava que " não há ideias senão nas coisas" e que "deveria escrever como um médico trabalha, sobre a coisa que tem diante de si, descobrindo o universal no particular" . Williams participou do movimento chamado de "Imaginismo" com base na apreensão das coisas naturais e dos pequenos fenômenos sociais. Imagens concretas, precisas, claras, fala comum e pormenores despretensiosos. Apesar desta fase inicial, acabou escrevendo, já no final de sua carre

Marianne Moore

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Marianne Moore - Poemas - Editora Companhia das Letras - 208 páginas - Tradução e Posfácio de José Antonio Arantes - Lançamento 1991. Marianne Moore (1887-1972) marcou a poesia norte-americana com a sua originalidade que aproximou a poesia  e prosa  conquistando poetas importantes da sua geração como Ezra Pound, T. S. Eliot, William Carlos Williams ou Wallace Stevens e também influenciou gerações de poetas posteriores como W. H. Auden, Elizabeth Bishop e o nosso João Cabral de Melo Neto. Por tudo isso foi definida pela crítica como "poetisa dos poetas", apesar de detestar chamar atenção e apresentar sempre um comportamento humilde. Ela recebeu o National Book Award por Collected poems publicado em 1951. A sua poesia de verso livre e metrificação silábica , com e sem rima, cheia de imagens é sempre surpreendente. Quando Moore morreu, Ezra Pound encomendou uma missa em sua memória, durante a qual leu os versos de "What are years": "o próprio pássaro

Google Art Project

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O Google Art Project é uma ferramenta on-line que permite a visitação virtual de museus em 360 graus e, utilizando a técnica Street View, aplicar zoom de alta precisão nas obras cadastradas. O exemplo das imagens é do MoMa de Nova York, onde podemos ver detalhes das pinceladas de Van Gogh no quadro " A Noite Estrelada " de 1889. Muitos museus famosos ainda não permitiram a inclusão no projeto, mas parece que a novidade veio para ficar. É certo que nada pode substituir a experiência de uma visitação real, mas esta ferramenta chega bem perto. Segue abaixo a relação de alguns Museus com links: Alte Nationalgalerie, Berlim Freer Gallery of Art, Smithsonian, Washington DC   The Frick Collection, Nova York Museu Kampa, Praga The Metropolitan Museum of Art, Nova York  MoMA, Museu de Arte Moderna, Nova York  Museo Reina Sofia, Madri Museo Thyssen - Bornemisza, Madri Galeria Nacional, Londres   Palácio de Versailles, França  

Friedrich Nietzsche - O caso Wagner

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Friedrich Nietzsche - O caso Wagner, Um Problema para Músicos e Nietzsche Contra Wagner, Dossiê de um Psicólogo - Editora Companhia das Letras - 117 páginas - Tradução, Notas e Posfácio de Paulo César de Souza. Um livro muito interessante e normalmente ofuscado pelo restante da bibliografia de Friedrich Nietzsche (1844-1900), onde o brilhantismo e cultura do filósofo alemão podem ser apreciados em toda a sua forma, concordando-se ou não com suas polêmicas opiniões. Esta é uma crítica implacável à música de seu conterrâneo e contemporâneo Richard Wagner (1813-1883), segundo Nietzsche um artista da décadence que torna doente aquilo que toca: "Eis o ponto de vista que destaco: a arte de Wagner é doente. Os problemas que ele põe no palco - todos problemas de histéricos, a natureza convulsiva dos seus afetos, sua sensibilidade exacerbada, seu gosto, que exigia temperos sempre mais picantes, sua instabilidade, que ele travestiu em princípios, e, não menos importante, a escolha

Elizabeth Bishop - O iceberg imaginário

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Elizabeth Bishop deixou somente 101 poemas, exatos, flores raras como ela.  "Já em seu livro inaugural North and South, de 1946, a capacidade de observação da variedade do mundo e a mutação de marcos exteriores (de objetos ou paisagens) em aglutinadores para um discurso do espírito se faziam sentir (...)" -  Elizabeth Bishop - Poemas - Tradução e Introdução de Horácio Costa - Editora Companhia das Letras - 1990. O iceberg imaginário (Elizabeth Bishop - 1946) Preferimos o iceberg ao navio, embora isto significasse o fim da viagem. Embora ele estivesse melancólico, como pedra de nuvem e todo o mar em volta fosse moção de mármore. Preferimos o iceberg ao navio; preferimos esta planície de neve que respira, embora as velas do navio jazessem no mar como segue no mar sem dissolver-se a neve. Campo flutuante, solene, perceberás que contigo um iceberg repousa, que a seu despertar pastará as tuas neves? Por esta cena um marinheiro daria os olhos. O navio é ignor

Ernesto Sabato - El escritor y sus fantasmas

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Este livro, publicado originalmente em 1963, pode ser considerado como uma espécie de diário do escritor argentino Ernesto Sabato (1911-2011) no qual ele apresenta as suas dúvidas, críticas, teorias e reflexões sobre a literatura e o ofício de escritor. Segundo o próprio Sabato definiu na apresentação à primeira edição: "este livro é constituído por variações de um só tema: por que, como e para que se escrevem ficções?" . Sendo assim, os tópicos estão sempre relacionados com a sua própria escrita ou de outros autores que  podem ser apenas citados como Proust, Tostoi, Balzac, Kafka, entre muitos outros, ou através de uma análise crítica mais demorada como: nos casos de Robbe-Grillet, Nathalie Sarraute, Jorge Luis Borges e Jean Paul Sartre. Sabato comenta sobre a inutilidade de uma "literatura nacional" já que em autores como Kafka (e ele próprio, diga-se de passagem) não conseguimos identificar elementos nacionalistas, mas sim universais. Adicionalmente, con